É graduado em Direito pela Ufes e assessor jurídico do Ministério Público Federal (MPF). Questões de cidadania e sociedade têm destaque neste espaço. Escreve às sextas-feiras

Senado da vergonha: misoginia contra Marina e tietagem a bets

Banalizar a agressão de gênero em espaços de poder é intolerável, assim como associar divergências políticas à licença para o desrespeito

Publicado em 30/05/2025 às 02h00

As cenas inusitadas ocorridas durante a sessão da Comissão de Infraestrutura do Senado, nas quais Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, foi alvo de manifestações grotescas de desrespeito, não apenas provocam indignação, mas também revelam facetas tóxicas da política nacional e os resquícios de uma sociedade marcadamente machista.

Infelizmente, a titular da pasta ambiental não é a primeira mulher a sofrer violência de gênero no cenário político – ambiente que, em tese, deveria primar pela equidade de representação. Exemplos recentes ilustram essa realidade: a Justiça Eleitoral capixaba, acatando ação do Ministério Público estadual, multou em R$ 10 mil o deputado federal Gilvan da Federal por danos morais contra a deputada Camila Valadão. Casos semelhantes vitimaram as vereadoras Karla Coser (Vitória) e Raphaela Moraes (Serra), agredidas verbalmente por pares masculinos no Plenário.

Em 2021, o Congresso instituiu a lei nº 14.192, que tipificou no Código Eleitoral o crime de violência política de gênero (artigo 326-B), punindo condutas como assédio, humilhação ou ameaça motivados por discriminação de gênero, raça ou etnia, com o intuito de obstruir campanhas ou mandatos.

Contudo, o episódio envolvendo Marina Silva não se enquadra nesse dispositivo, pois a norma exige que a vítima seja candidata ou detentora de mandato eletivo – não sendo o caso da ministra, embora ela já tenha exercido tal função no ado.

Ainda assim, as declarações proferidas pelos parlamentares podem caracterizar crimes contra a honra (calúnia, injúria ou difamação), previstos no Código Penal com agravantes específicos: aumento de um terço por ser a vítima ministra de Estado e em dobro por ter sido o delito motivado por questões de gênero.

O presidente da comissão, Marcos Rogério (PL-RO), determinou que Marina "se colocasse no seu lugar"; Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que ela não tinha "direito" de cumprir suas atribuições legais; e Plínio Valério (PSDB-AM) declarou respeitá-la "como mulher, não como ministra" – o mesmo parlamentar que, em outra ocasião, vocalizou desejar seu enforcamento. Além das possíveis consequências jurídicas, tais atitudes expõem a degradação do decoro parlamentar, a ser analisada pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar mediante representação.

Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, discute com senador Marcos Rogério, presidente da Comissão de Infraestrutura do Senado
Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, discute com senador Marcos Rogério, presidente da Comissão de Infraestrutura do Senado. Crédito: Geraldo Magela/Agência Senado

É lamentável que integrantes de uma das casas legislativas mais importantes do país alternem entre reverenciar influenciadores digitais que lucram com apostas irresponsáveis e destilar misoginia contra uma autoridade de reconhecimento global na área ambiental.

A conduta desses senadores é especialmente chocante em um país que figura entre os mais violentos para as mulheres. Banalizar a agressão de gênero em espaços de poder é intolerável, assim como associar divergências políticas à licença para o desrespeito.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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